A READAPTAÇÃO DAS NOVELAS NO MUNDO MODERNO

17/03/2019

Porque as novelas já não funcionam mais num mundo tão imediatista e perdem o público jovem cada vez mais

Foto da novela "O Tempo Não Para" - Reprodução: Globo
Foto da novela "O Tempo Não Para" - Reprodução: Globo

Há tempos novelas tem perdido o público e sua força. Para alguns, desde a inesquecível e icônica Avenida Brasil (2012), não se faz uma novela tão boa. Para outros, as tramas são clichês, mal desenvolvidas e cheias de perda de tempo. E há quem diga que a culpa é dos streamings, novidade no mercado audiovisual em geral, e que eles chamam mais atenção do que canais abertos. Resumindo nas palavras de meu pai:

"Ninguém mais assiste Televisão."

Será mesmo? Se sim, qual a causa e consequência disso?

Precisamos analisar todos os fatos: 

Há tempos as audiências vem caindo e mesmo quando para a Globo são motivo de comemoração, para críticos são apenas satisfatórios. Isso se deve ao fato de que a maioria das pessoas não quer mais assistir televisão em canais abertos e acompanhar as tramas dependendo do horário em que passam. As pessoas se tornaram imediatistas e essa é uma palavra que irei repetir bastante durante a análise. O que isso significa? Quando elas querem assistir, elas assistem. Horários já não prendem mais pessoas em televisões.

Acaba que a maioria das pessoas chega em casa, liga a Netflix e escolher o que assistir, quando assistir, quando parar e voltar. Os mais tradicionais ligam e fazem suas tarefas assistindo novela, ou jornais. Mas essas pessoas, as que ainda assistem recorrentemente, não são tão imediatistas emergenciais - ou millenials, se preferir. - como os amantes de streaming que precisam sempre estar por dentro dos assuntos do momento.

Outro fator, dentro do imediatismo, é de que novelas são previsíveis. Os resumos e finais são vazados semanas antes do fato ocorrer, fazendo as pessoas perderem o interesse. Ninguém gosta de spoiler. Como a informação se espalha rápido, não é preciso mais assistir a novela pra saber o que acontece nela, você pode ter essa informação quando quiser.

Outro grande problema, é que as tramas são, em sua maioria, lentas e cheias de barriga, com tempos de duração desnecessários. Novelas que andam em círculos, levando o personagem sempre pro mesmo lugar ou situação, que não fazem a trama andar ou só servem para a famigerada encheção de linguiça desprendem a atenção do público. 

Ninguém mais quer ver tramas arrastadas, como o romance de cinco meses no passado de "Espelho da Vida" ou as tramas circulares dos vilões de "O Tempo Não Para". Ninguém mais quer ver personagens mal desenvolvidos e histórias não aproveitadas como praticamente todo o elenco da "Malhação - Vidas Brasileiras", no ar atualmente. Assim como ninguém quer atores subaproveitados ou de figuração de luxo como na problemática novela "O Sétimo Guardião". Todas essas novelas citadas, são exemplos no ar de que esses problemas juntos, resultam numa péssima época pra emissora. Num ano onde - quase - nenhuma das novelas é boa ou digna de ser assistida e comentada com gosto, a Globo se encontra num caminho difícil e precisa achar a sua luz pra mudança. Mas ela não é a única que enfrenta problemas. "As Aventuras de Poliana" tem afastado o público que antes gostava de ver as aventuras da pequena, já que a atriz está crescendo e a trama perdendo sua força, tanto quanto andando em círculos e se arrastando para ficar no ar por mais tempo. Não vou nem entrar muito no assunto sobre as milésimas reprises de dramalhões mexicanos que já vimos várias vezes.

Todos esses problemas de desenvolvimento de roteiro, aproveitamento de atores e tramas, afastam o público de todo o resto da novela. É como se você estivesse lendo um livro e no meio do capítulo, mudasse para outro livro completamente avulso. Não é interessante e causa desconforto, fazendo com que mesmo quem goste da trama, se afaste por não se identificar com os personagens mal aproveitados e barrigas na novela. Isso aconteceu nos primeiros meses de "Espelho da Vida", arrastando o passado tão forçadamente para que o público entendesse a história, Jhin acabou perdendo mais ainda o público, que parecia "ver o mesmo episódio todos os dias."

Autores de novelas tem esticado suas tramas por não terem mais conteúdo e colocando personagens avulsos e caricatos que deveriam ser importantes tentando expor algo, representar ou fazer com que alguém se identifique. Esse é um caso recorrente nos personagens de Marcelo Serrado e Carolina Dieckmann na novela das 21h e as quinzenas de Malhação, em especial a incômoda e problemática quinzena sem desenvolvimento de Álvaro (Eike Duarte), que tinha que representar um jovem com sintomas de depressão que queria ajuda. O ator aliás, faz um ótimo trabalho, mas o texto do folhetim não ajuda.

Além de tudo isso, temos aproveitamento de tramas antigas e apelos, o maior exemplo disso é "Verão 90" no ar atualmente como novela das 19h. É a típica novela que reaproveita tramas de outras novelas e faz um "mexidão" com vários personagens que lembram nitidamente outros e usa isso como uma máscara que chamam de; homenagem. Além do apelo emocional para a memória afetiva de quem viveu nos anos 90. O pior de tudo, nem a reconstrução da época é feita com veracidade e vontade, tornando a novela mais escrachada do que já é. Quem assiste, ou assiste pelas tiradas cômicas (o mexido de outros personagens e situações que já vimos) ou pela memória afetiva.

E apontado por muitos como o pior problema das novelas atualmente, fica em primeiro lugar; o tempo de duração. 

Foi-se o tempo em que uma novela ficava no ar durante um ano ou mais. Assim como já está na hora do mercado das emissoras abertas notar que não se segura mais as pontas de uma trama por seis meses. 

Para os autores de novela, principalmente os novos, chegando já adaptados para mini-séries ou séries, alongar uma trama por seis meses é o que causa todos os outros problemas citados a cima. Então deveríamos mandar embora todos os autores ou rever o tempo de duração dessas tramas no ar?

Tramas tem sido mal aproveitadas justamente pelo tempo de duração. "O Tempo Não Para" que antes de sua estréia e na própria prometiam ser um novelão, deixaram de ser quando todas, repito, todas as tramas ficaram andando em círculos com as vilanias de Betina, a falência da empresa de Samuca, as doenças dos congelados e a troca do vilão flop Emílio, para Lúcio. Talvez se fosse uma série, personagens desnecessários seriam cortados e a trama melhor aproveitada, assim como os vilões, núcleos secundários e a fantástica ideia de uma cientista má querer se aproveitar dos congelados, que só foi posta na reta final. 

A ideia inicial era boa, mas se perdeu com o tempo e se tornou uma reciclagem de "I Love Paraisópolis", ou do que essa deveria ter sido. A melhor parte da trama era ver a readaptação dos congelados no mundo atual e logo esse pequeno prazer foi tirado do público. O desenvolvimento dos personagens no presente foi tão raso que logo eles já poderiam ser considerados pessoas do século 21, tirando o modo de falar; "decerto que sim."

Posso citar também, novamente, "Espelho da Vida" que se arrastando numa trama vazia e sem desenvolvimento do passado, poderia facilmente ter contado tudo que aconteceu em cerca de 12-16 episódios, ou menos, se fosse uma série. Entre eles, dois, no máximo quatro se prenderiam a trama do passado, para explicar tudo. 

O modo como Jhin levou isso por cinco meses afetou grande parte da trama, deixando de desenvolver núcleos paralelos que poderiam ter sido melhor aproveitados, como os atores famosos que vieram para Rosa Branca ou o núcleo teen. Deixando tudo para o final e repetindo as mesmas cenas e situações no passado, Jhin afastou o público e a trama perdeu o fôlego que tinha ganhado em Novembro (quando se dedicou exclusivamente ao presente). Para alguns, o passado poderia ter sido visto em três capítulos. Para outros, em duas semanas. Para mim, cinco meses de novela foi demais para a cabeça da autora, que se tivesse vendido a ideia inicial para alguma produtora de streaming, poderia ter aproveitado muito mais.

Percebam que repeti várias vezes ao longo da análise a palavra série e também streaming. O quesito disso, no entanto, não é diminuir as novelas que tanto nos trouxeram risadas, lágrimas, boas histórias e nos acompanham as décadas, mas sim equiparar elas as séries para as pessoas que já não estão mais acostumadas a ver Tv. Por diversos motivos, as novelas tem perdido sua força e dando palco para as séries de todo o mundo. Isso acontece porque as pessoas, imediatistas como estão, não querem mais perder tempo com histórias circulares, arrastadas, clichês ou caricatas. Elas querem coisas inovadoras, fantásticas, criativas e de pouco tempo de duração; não se tem mais tempo como se tinha antes para se perder. As pessoas querem agilidade, tramas desenvolvidas bem num curto espaço de tempo, querem episódios e poder ver a hora que quiserem.

Séries, em sua maioria, aproveitam muito melhor as histórias que novela. Histórias que não tem força o suficiente para sustentar uma novela, podem, facilmente, dar uma boa série. Isso acontece porque, num curto espaço de tempo, dá pra centralizar e desenvolver bem a trama central e cortar personagens avulsos que esticam a história. Os núcleos secundários são sempre pequenos, note que uma série não é lotada de personagens - e se é, sempre vão indo embora, morrendo ou dando espaço para a história do outro ser desenvolvida - assim servindo de escada para que os personagens principais tenham destaque. Com poucos personagens em cena, o autor não se perde também de sua ideia inicial nem cria barrigas que ninguém quer assistir. Tudo que acontece na série tem que ser bem aproveitado porque já se tem pouco tempo em cena, e todos os acontecimentos levam para um acontecimento maior que causa mais euforia e animação para continuar a assistindo.

O mercado audiovisual tem investido em séries ao redor do mundo todo, até mesmo as de baixo custo ou as Web-Séries. As emissoras deveriam estar usando isso ao seu favor mais do que estão. Canais abertos já tem comprado direitos de exibição de séries americanas e exibido elas em seus canais, mas já foram passadas pra trás quando se tem o conteúdo a hora que quiser em vários outros sites. Passaram então a produzir suas próprias séries e mini-séries como uma forma de experimento, que diga-se de passagem, tem tido bom resultado. Uma nota de bom desempenho para as séries da Globo; "Assédio", "Justiça", a delicada e pesada "Sob Pressão" a inovadora "Supermax" e várias outras. A Globo usa de histórias que são densas demais para o horário nobre, que deveria ser leve e mais rasa e as aproveita em dez episódios bem produzidos e calculados. Não digo que talvez seja a hora de extinguir as novelas e passar em seus lugares várias séries, emendando temporadas e temporadas ou sempre oferecendo novas séries. Mas digo que seria bom que as emissoras revissem os resultados nas mídias sobre as novelas e sobre as séries em geral. É muito mais interessante uma trama de época densa como "Os Dias Eram Assim" do que praticamente um longo remake de várias histórias como "Verão 90".

Em suma, as emissoras não devem extinguir suas novelas, nem parar de produzir ou comprar direitos de séries. Pelo contrário, deve se investir cada vez mais em produto original para oferecer para o público mais do que só o streamings com série americana. Por outro lado, tem que rever o tempo de exibição de suas novelas, diminuindo-as drasticamente para no máximo quatro meses, enxugando as tramas e as deixando mais limpas e com isso, mais atraentes para um público que sempre muda de gosto.

Os canais de televisão aberto precisam, urgentemente, se readaptar ou vão acabar perdendo mais ainda o público, que imediatista como está, não espera nem dez segundos de novela pra desligar a televisão quando nota que aquilo segue uma fórmula que já não funciona mais. As pessoas ainda assistem televisão, só já não assimilam mais as coisas como eram antes.


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