Globo mostra que existem novelas eternas e outras, não

11/08/2020

Rede Globo teve que se adaptar em meio a pandemia e resolveu reprisar novelas antigas. Pra alguns horários, as escolhas foram certeiras, para outros, a audiência e o público mostram que nem tudo que envelhece fica cada vez melhor.

A Rede Globo teve que se adaptar em meio a pandemia, pausando todas as gravações de suas produções, entre elas a gigante Amor de Mãe. Existiu a possibilidade, em dado momento, de passar Amor de Mãe desde o começo, pois quando a pandemia acabasse, voltaria de onde parou. Com a pandemia se esticando cada vez mais, a solução foi reprisar novelas com temáticas parecidas ou que agradassem o público em meio a quarentena. Funcionou? Nem tanto.

Enquanto a audiência de "Salve-se quem puder" estava se estabilizando e a novela pastelão ganhando o público que procurava um folhetim leve na faixa das 19h, em seu lugar entrou a reprise especial de "Totalmente Demais", novela que foi sucesso de audiência em 2015 e tem uma temática ainda interessante nos dias de hoje.  Diferente de "Salve-se quem puder", "Totalmente Demais" não força narrativas nem um humor exagerado e tem personagens palpáveis, como Carolina (interpretada pela Juliana Paes) que não é exatamente um vilã e sim uma pessoa com qualidades e defeitos, além dos núcleos cômicos leves. A internet amou a escolha da novela e não sentiu falta do trio de fugitivas que se esforçava pra segurar o público antes da quarentena. 

Já a escolha de Malhação, foi além de justificável, muito bem colocada. Sucesso entre os jovens, a Malhação "Viva a Diferença" foi um sucesso estrondoso em 2017 e 2018, apresentando personagens diferentes e pautas jovens que precisavam ser debatidas. Grande sucesso de audiência e entre o público adolescente, a escolha ainda foi feita para que pós a reprise da novela, se lançasse a série spin-off das protagonistas de "Viva a Diferença" no Globoplay: "As Five". 

Alguns não curtiram a escolha por ser uma Malhação muito recente, preferindo as versões mais antigas, que hoje, estão também disponíveis na plataforma de Streaming da Globo. Curtindo ou não, a audiência de Malhação tem se mantido estável e a espera pela estreia da série, dia 12 de Novembro. A antiga novelinha, Malhação "Toda Forma de Amar" teve o final adiantado, já que a história já andava em círculos e o público nem notou a diferença.

Na faixa das 18h, a escolha foi da melancólica, documental e de época "Novo Mundo". Apesar de não ser um grande sucesso da Globo, foi uma novela bem avaliada pela crítica e com uma produção de alto nível, com elenco de peso. A escolha foi feita puramente pensada na sucessora da novela, "Nos Tempos do Imperador" que ainda nem tinha sido lançada. Contando a história de Dom Pedro II, a escolha se dá certeira se pensarmos numa linha temporal e possíveis referências de uma novela para a outra. Ademais, foi uma escolha insossa, que não agradou nem desagradou o público e já está chegando na reta final, dando lugar a "Flor do Caribe". A escolha do romance de Grazi Massafera com dois homens desagradou o público que não entende a escolha de uma novela com a história tão esquecível, baixa audiência e carisma. Além de afetar a escolha de uma novela de época que desse a entrada a "Nos Tempos do Imperador".

A pior das escolhas em um momento de quarentena, onde só queremos assistir algo legal depois do Jornal Nacional, com certeza foi na faixa das 21h. A escolha foi "Fina Estampa", novela de Aguinaldo Silva (autor da bomba mais recente "O Sétimo Guardião"), que passou em 2011, época em que o mundo tinha uma perspectiva bem diferente do que tem agora. A escolha se deu por um simples motivo: audiência. 

Na época em que lançada, "Fina Estampa" era sucesso de audiência com as tramas vilanescas de Tereza Cristina (Christiane Torloni) e as trapalhadas de Crô (Marcelo Serrado), que aliás já lá em 2011 era considerado o melhor personagem da novela. A trama era popular e tinha personagens "gente como a gente", além de um sonho ideal que todos gostariam de passar um dia: ganhar na loteria. A trama de uma mulher batalhadora, que sustenta os filhos sozinhos e dá duro todos os dias, pobre e humilhada pela nobreza, dar a volta por cima ganhando na loteria, conquistou o público. Essa trama aliás, sempre conquistou o público por ser apelativa. 

Recentemente, tivemos um sucesso estrondoso de audiência com uma história parecida, a da boleira. "A Dona do Pedaço" muito se assemelha com "Fina Estampa", mulher pobre e batalhadora fica rica e dá a volta por cima. Grizelda e Maria da Paz tem o mesmo histórico e, se funcionou recentemente com a audiência a história da boleira, porque não reviver a história de Pereirão? Isso é o que devem ter pensado na hora da escolha da reprise. Com tantas novelas com a mesma temática popular, boa audiência e bem construídas, as tramas vazias e rasas de "Fina Estampa" não agradaram ninguém e não fazem sentido algum.

Em meio a pandemia, nos atentamos direito a novela, trazendo um novo olhar a trama que em 2011, fez sucesso. A novela tem personagens intragáveis, falas preconceituosas, homofóbicas, anda em círculos, transforma a homossexualidade de Crô numa mera piada e generaliza ele a servente de uma mulher cis branca e rica. Crô, personagem mais amado da novela na época e, que ganhou até filme solo nos cinemas pra ele, é o personagem de longe mais problemático da novela, representando uma imagem nociva pro meio LGBTQI+.

Temos também a romantização do abuso e violência contra a mulher, a romantização da traição e de assassinatos cometidos e todo o núcleo com a história de Esther e Bia e a bebê Vitória, um erro médico gravíssimo.  A novela ainda nos força a gostar de casais que não tem o mínimo de química. Talvez não víssemos isso antes, mas Grizi não combina NADA com René, muito menos com Guaracy. Nem é possível, aliás, imaginar ela com o Pereirinha. Caio Castro como Antenor é insuportável, um dos piores personagens do ator. 

Sophie Charllote não traz nada de novo a trama e faz um papel de casal que ninguém entende o propósito com Marcos Pigossi, que revelou essa semana em uma live com o ator João Vicente de Castro no Instagram do GNT que se envergonha da novela:

 "Essa novela deveria ser proibida de reprisar, porque são tantas barbaridades."

São inúmeros problemas na novela que estão fazendo com que o público se afaste da televisão pós Jornal Nacional. A escolha terrível nos fez lembrar que, apesar de gostarmos de uma novela na época que passou e anos depois lembrarmos dela com uma memória afetiva, temos que concordar que talvez ela não seja tão boa assim. Fina Estampa é uma dessas novelas problemáticas, que na nossa memória parecia interessante e boa, mas agora revendo, sabemos que envelheceu super mal.

Entre tantas possíveis escolhas para reprise, a escolha da Globo nos fez desenterrar o horror de uma novela ruim e fez o público pedir a volta de Amor de Mãe, que com audiência morna, conquistava a crítica por inúmeros motivos como uma obra bem feita.

Quase dez anos depois de sua estreia, o mundo mudou e não há espaço para "Fina Estampa" e suas tramas onde gays são "chaveiros", mulheres que existem no elenco em prol de encontrar um amor, uma vilã rasa e cheia de preconceitos e a rivalidade feminina tão enraizada que já não faz mais sentido.

Num ano como 2020 tão pesado de diferentes formas, enquanto "Fina Estampa" foi um erro, a Globo acertou em trazer novelas clássicas para a Globoplay, em especial a antiga "Vale Tudo", que de antiga não tem nada com uma trama tão próxima da nossa realidade atual. Ainda bem que hoje, podemos escolher desligar a televisão quando horrores como Tereza Cristina e Crô estão passando e aproveitar algo a nossa escolha. Nem tudo que envelhece fica cada vez melhor, aprendemos agora que há e haverão novelas que vai ser melhor deixar guardadas pra sempre no ano em que passaram.

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